Os gringos brasileiros

Chicolelis relembra do convívio com executivos gringos que ajudaram a consolidar a indústria do automóvel e se apaixonaram pelo Brasil

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Ex-presidente da Mercedes trouxe a tradicional festa alemã para terras paulistas (Fotos: Divulgação)
Por Chico Lelis
Publicado em 16/06/2024 às 17h03

Um deles aprendeu a tocar tamborim. Outro, além de trazer a Oktoberfest para o Brasil, volta sempre para ir à praia e pescar. Tem aquele que preferiu ter dois dos seus filhos nascidos no Brasil, mais um que é elogiado por todos os jornalistas do setor. E tem aquele que, nas vitórias do seu time no domingo, ia, na segunda-feira, para a fábrica com a camisa do seu Corinthians.

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São muitos os casos de executivos de montadoras (e outras empresas, claro!) que pelo seu comportamento e atitudes, podem ser chamados de “brasileiros”, por nós, nativos.

Vou começar por aquele (que já nos deixou) com quem tive estreito contato e que me chamava de amigo, Mark Hogan (presidente da GM e responsável pelos principais lançamentos da empresa na década de 90) era apaixonado pelo Brasil e o samba. Sua paixão era tal, que ele foi aprender a tocar tamborim, para sair no carnaval carioca pela Portela, no Rio de Janeiro. Gravou o enredo da escola em um cassete (quem ainda lembra desse objeto?) e, todo dia, quando o Severino (o motorista) o pegava em casa, em São Paulo, ele fazia a viagem de cerca de 50 minutos até a fábrica, em São Caetano do Sul, ensaiando. E, na volta, a mesma coisa.

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Ex-presidente da GM, Mark Hogan, era tão apaixonado por este lado de baixo do Equador que até aprendeu a tocar samba

Esse alemão, que não mora mais no Brasil, mas volta aqui todo ano para ir às nossas praias, pescar, rever amigos (que se referem a ele como “o alemão mais brasileiro que conheço”) e visitar a São Paulo Oktoberfest, idealizada por ele (junto com Walter Carvalho). Philipp Schiemer. Ele esteve por duas vezes atuando na Mercedes-Benz do Brasil. Sua primeira vez foi como responsável pela Sprinter e, na segunda, como presidente da empresa.

Este outro, também alemão, Wolfgang Sauer (que também não está mais entre nós), enfrentou o início do movimento sindical no Brasil, como presidente da Volkswagen. Como bom brasileiro, gostava muito de tomar cachaça, sempre sem exageros. Exagero só mesmo com seus charutos.

Bem-humorado, enfrentava as dificuldades enfrentadas pelo País afirmando que “Deus é mesmo brasileiro”. Vez por outra tinha que falar à Imprensa que a GM não conseguiria tirar a VW da liderança, como anunciava o presidente da montadora norte americana. Até hoje, Sauer é lembrado, entre os jornalistas da chamada “velha guarda” como um dos mais respeitados e queridos “gringos brasileiros” do setor.

E o presidente da fabricante americana que Sauer retrucava pelo menos duas vezes ao ano era Joseph Sanchez, da GM. Esse, além de “brasileiro” era também torcedor do Corinthians e que frequentava os jogos do “Timão”, nos domingos, em São Paulo. Quando o seu time ganhava, na segunda-feira ele chegava à fábrica com a camisa do Corinthians e circulava pela linha de produção, aplaudido pela “galera” corintiana.

Voltando para os EUA, dirigindo a Oldsmobile (quem lembra?) Sanchez foi morar em Lansing (capital de Michigan), em uma casa decorada com azulejos e ladrilhos levados do Brasil. Visitei-o lá, mas não vi nenhum dos azulejos com o escudo do Corinthians.

Outro norte-americano, Robert Gerrity, era presidente da Ford no Brasil, quando do lançamento do Escort. Eu era repórter do setor (isso existia nos anos 80, repórter de setor) e tinha um ótimo relacionamento com aquele grandalhão simpático que sempre recebia com atenção a Imprensa.

Certo dia, durante entrevista, ele me perguntou se eu seria capaz de guardar um segredo. Claro que respondi sim e ele me levou a um galpão na fábrica e me mostrou pela primeira vez à Imprensa, o Escort. Abriu o carro e pediu que eu entrasse. Ao entrar no banco traseiro, disse que era um pouco apertado. Mantive minha palavra.

– “Para mim também”, disse ele, mais alto que eu.

A maior do Bob foi quando ele, em uma coletiva, disse que um fabricante, cujo nome tinha quatro letras e começava com ”F”, ia deixar o Brasil. Premonição?

Pobre do Alberto Fava, responsável pela operação Fiat no Brasil que teve que responder um milhão de vezes que a empresa não sairia do Brasil. Hoje o gentil atencioso Fava deve estar rindo da fala do Bob.

Outra dessas figuras é Gianni Coda, que foi presidente da Fiat no Brasil e torcedor do Atlético Mineiro. Ele travou grandes batalhas com diretores da empresa, especialmente Marco Antônio Lage (Comunicação), cruzeirense, antes do início de cada reunião que acontecia às segundas-feiras, quando no domingo houve o clássico no Mineirão.

É claro que existiram muitos outros “gringos brasileiros”, em qualquer tipo de empresa ou fabricante de veículos, como os citados, com quem tive a oportunidade de conviver em meus quase 60 anos de jornalismo. Iniciados em 1969, em A Tribuna, em Santos e passando pela Ford, GoodYear, O Globo e Diário do Comércio.

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