Aumento do biodiesel: ótimo para o produtor, péssimo para o usuário

Bancada ruralista força governo a subir o percentual do biodiesel que entope motores de caminhões, picapes, ônibus, tratores e geradores

tampa do bocal do tanque de combustivel de veiculo a diesel
Aumento do percentual do biodiesel considerou apenas o interesse dos produtores e não tem nenhum critério técnico (Foto: Shutterstock)
Por Boris Feldman
Publicado em 20/12/2023 às 19h03

Que se danem os motoristas! Seus caminhões, ônibus, jipes e máquinas agrícolas entopem os motores com o biodiesel mas o produtor do biodiesel garante seu faturamento sob o poderoso argumento de estar descarbonizando planeta.

Não há como negar: o biodiesel seria – teoricamente – um excelente substituto do diesel de origem fóssil pois é renovável e produzido a partir de vegetais. Uma excelente bandeira a ser defendida. Entretanto, há um consenso de que o percentual máximo para sua adição ao diesel – adotado na Europa – não deve ser superior a 7%, sob risco de prejudicar e encarecer a operação e manutenção dos motores.

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No Brasil, os motores resistiram sem problemas até 10%, o chamado B10, mas está hoje em B12, previsto o B15 em 2025 e o governo quer elevá-lo – irresponsavelmente – para 25%, forçado pela bancada ruralista.

Problemas nos motores

O biodiesel produzido no Brasil – principalmente a partir da soja – é obtido a partir do antigo processo de transesterificação e sua molécula é bem diferente do diesel. Seus problemas:

  • custo é muito superior e encarece o do diesel na bomba;
  • é mais higroscópico e absorve portanto umidade que provoca a formação de borra no fundo do tanque, exigindo troca muito mais frequente de filtros e limpeza de reservatórios;
  • em temperaturas muito baixas – que ocorrem no sul do país – ele congela ou forma cristais que prejudicam ainda mais (entopem) filtros e bicos injetores;
  • aumenta o consumo de combustível;
  • aumenta a emissão de Nox, um dos gases que poluem o ambiente.

Usuários protestam

A CNT (Confederação Nacional dos Transportes) tem 200 mil associados que sofrem na pele (ou melhor, no bolso…) os problemas provocados pelo excesso de biodiesel. Ela acaba de publicar uma nota afirmando que:

“A CNT (Confederação Nacional do Transporte) expressa sua grande preocupação com o risco de novo aumento do percentual de biodiesel de base éster ao diesel. A Confederação entende que, para essa decisão, não deve ser considerada apenas a capacidade de produção do insumo no Brasil, mas as consequências desse aumento sobre o funcionamento dos veículos e os impactos econômico, ambiental e de segurança sobre toda a cadeia de transporte e logística do país.”

Quem também se manifestou contra a medida do governo que favorece os produtores mas prejudica os usuários foi a Sambaíba Transportes Urbanos, que opera uma frota de ônibus em São Paulo. Em matéria do jornalista Nicola Pamplona (Folha de São Paulo), a empresa diz ter realizado testes com o B15 e “concluiu que o uso de 15% de biodiesel no diesel de petróleo danifica ônibus e amplia o custo do serviço prestado”.

Ela apresentou o estudo à ANP, onde afirma ter usado o B15 por sete meses e ter encontrado “um cenário desfavorável do ponto de vista técnico, causando aumento de custo operacional, além de diversas ocorrências que prejudicaram o desempenho técnico de nossa frota”. A Sambaíba precisou reduzir de 30 mil para 4.500 km o intervalo de substituição de filtros dos ônibus.

Foi necessário também aumentar a frequência de troca de filtros do sistema de recebimento de combustível e do tanque da garagem, com aumento de 417,7% nos custos destes itens. Além disso, os ônibus (Mercedes-Benz) “foram impactados por perda de potência e falhas no sistema de partida”.

Aumento do biodiesel sem problemas

Existe a possibilidade de utilizar biodiesel em percentuais maiores sem causar danos aos motores?

  • Sim, desde que tomadas medidas extremas de cautela e com aditivos específicos pode-se abastecer o veículo até com o B100.
  • Outra opção é o “Diesel Verde”, ou HVO (Hydrotreated Vegetal Oil) também produzido a partir de oleaginosas num processo mais sofisticado com a presença do hidrogênio. Sua molécula é exatamente igual à do óleo produzido a partir do petróleo, mas é um processo mais caro, que exige investimentos que os produtores do biodiesel não estão dispostos a fazer. Por isso brigam para “emplacar” seu produto atual, ainda que prejudicial ao usuário. A Petrobrás já iniciou a produção do Diesel Verde.

Enquanto o governo se curvar diante do poderoso lobby da bancada ruralista que defende o biodiesel protegida sob a bandeira ecológica, ignorar os problemas técnicos e os prejuízos dos motoristas, nossos motores diesel vão continuar entupindo e encarecendo o transporte no país.

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7 Comentários
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Marcos Freitas 26 de dezembro de 2023

Se ainda fosse o biodiesel obtido a partir da cana, vá lá. Mas esse “biodiesel” obtido a partir de óleos, é meio complicado mesmo.

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Santiago 22 de dezembro de 2023

Pior do que aqueles erros não fiscalizados e nem punidos, são os equivocos impostos oficialmente via decreto.
Se tais medidas são tecnicamente e comprovadamente prejudiciais, entendo que sejam passiveis de revogação. Afinal temos uma Constituição, e também Leis que resguardam os direitos do consumidor.

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Miguel barbosa Nascimento 22 de dezembro de 2023

Já sofremos com o percentual q tem agora aumentar mais tamos ferrados na manutenção carros q perdem potência fácil, tenho uma toro e sofri bastante com isso,fica difícil haja egr

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Paulo Gomes 21 de dezembro de 2023

Se for verdade, trata-se de um governo incompetente e himbessil

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Gilmar Fernandes Machado 21 de dezembro de 2023

O governo não está atendendo o produtor rural, ele está atendendo seus interesses próprios, para o produtor não faz diferença pois é o mesmo preço, não importa quem está comprando, pois o Brazil não dá conta de produzir o tanto que o mundo consome, o interesse do Lula é nas fábricas que fazem o biodiesel que são de seus amigos, não tem esse negócio de meio ambiente, tudo enganação, aonde já se viu isso colocar produto alimentício em óleo diesel e dizer que está preocupado com meio ambiente? Tem que se preocupar é com a fome, sem falar nos danos e prejuízo que vai causar: não precisa de mistura nenhuma, o diesel puro é muito melhor.

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Leonel 21 de dezembro de 2023

Pois é… mas se ao invés de se colocar a culpa de tudo no “governo”, o eleitor aprendesse a votar direito e tirasse do Congresso toda essa corja que só defende os seus próprios interesses? O que significa “bancada ruralista”? Políticos eleitos pela própria sociedade, mas que depois de agraciados esquecem os verdadeiros motivos e a quem deveriam servir. Cada eleição é uma oportunidade para fazer o certo, porém, vemos a cada 4 anos as mesmas figurinhas carimbadas de sempre. Então, como podemos mudar a nossa realidade se somos incapazes de sequer mudar o nosso Congresso?

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Claudio Dias 20 de dezembro de 2023

É sempre assim. No caso do Diesel é complicadíssimo esse aumento excessivo de Biodiesel esterificado, mas no fim o Governo vai lá e aumenta na proporção que quiserem (e pouco importa ir com dados técnicos provando por a+b que é uma péssima decisão. Ela será sumariamente ignorada).
Com a Gasolina mesma coisa. Em breve vamos chegar ao absurdo de 30% de álcool misturado, que é um percentual tão elevado que prejudica principalmente os carros importados que foram fabricado para rodarem com gasolina apenas.
Como nada acontece com o Governo, eles fazem o que bem entendem…

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