Brasil: estranho país onde tem lei que não pega

Centenas de vítimas fatais poderiam ser evitadas nas ruas e rodovias brasileiras anualmente fossem respeitadas leis básicas de segurança

buggies na praia jericoacoara foto andre dib shutterstock
Andar na traseira do buggy: prática perigosa e ilegal - mas que não é fiscalizada (Foto: Andre Dib | Shutterstock)
Por Boris Feldman
Publicado em 21/10/2023 às 09h03

Lombada é legal ou ilegal?

Mais para ilegal, pois o Contran foi muito claro no artigo 6º de sua Resolução n.600/2016, ao especificar detalhadamente todos os parâmetros, medidas e sinalização das “ondulações transversais” nas vias públicas. Solenemente ignoradas por autoridades municipais, estaduais e federais.

A irregularidade pode ser fatal: em outubro de 2021, um motociclista perdeu o controle direcional ao atravessar um destes “quebra-molas” numa avenida central de Uberaba, bateu contra uma árvore e faleceu. Quais as consequências deste previsível acidente?

lombada quebra mola portal
Quebra-molas: difícil encontrar um dentro dos padrões legais (Foto: Shutterstock)

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O Ministério Público abriu um inquérito para investigá-lo, determinar responsabilidades, acionar a prefeitura e tomar as medidas legais cabíveis? Quem construiu o obstáculo? A própria Prefeitura ou alguma empreiteira contratada? Qual engenheiro se responsabilizou pela obra? O CREA tomou providências? A família da vítima acionou o órgão público e exigiu uma indenização?

Estas abomináveis “ondulações transversais” são construídas livre e irregularmente em todo o país, sempre fora das especificações, mal sinalizadas e danificando os veículos.

Buggies

São inegavelmente charmosos estes buggies, principalmente para circular nos dias ensolarados de céu azul, no litoral, praias, dunas, avenidas litorâneas. De construção simples, baseados numa plataforma de VW refrigerado a ar (Fusca ou Brasilia), com carroceria em fibra de vidro, conversíveis, fazem a alegria de quem mora no litoral, turistas atrás de curtir belas paisagens e também o sustento de centenas de “bugueiros”, profissionais destes veículos de lazer.

Um dos problemas dos buggies é a duvidosa origem de sua mecânica: além das fábricas especializadas que os constroem a partir de componentes novos, existem os “fundos de quintal” que montam verdadeiras aberrações sobre rodas, com plataformas recuperadas de acidentes (do tipo PT), desalinhadas, empenadas, com componentes de direção, suspensão e até freios de procedência duvidosa. Que seriam reprovados em qualquer empresa de certificação veicular.

buggies na praia jericoacoara
Buggy: muitos são veículos precários

Mais grave ainda é que, apesar do ambiente festivo e toda a envolvente alegria dos passeios encantadores com vento no rosto e o céu como testemunha, eles circulam livres e soltos carregando um passageiro ao lado do “bugueiro” e mais dois ou três atrás, no “banco” sobre o motor.

Um verdadeiro perigo, pois não contam com rigorosamente nenhum cinto de segurança. Por acaso (…) um item obrigatório para todos os passageiros de qualquer veículo, pelo código de trânsito.

Picape lotação

Por falar na precariedade do buggy, é no Nordeste que ele prolifera como veiculo de aluguel ou em passeios guiados. (“Com ou sem emoção, Madame?”). Uma das cidades onde ele é oficializado (necessariamente com motorista) para roteiros pelas dunas é Jericoacoara, no Ceará. Onde há restrições para a circulação de automóveis, inclusive para os turistas que chegam na cidade. São obrigados a deixá-los na periferia, em estacionamentos controlados pela prefeitura local. E como acabam de chegar nas pousadas?

É quando entram em cena as famosas “picapes-lotação”, com a caçamba de carga adaptada com bancos que carregam 6 ou mais pessoas até os hotéis no centro da cidade. Adaptação grotesca mas oficializada pela municipalidade como transporte oficial de turistas. Não se sabe a qualidade do projeto, o tipo de fixação dos bancos na caçamba, sua integridade, se o peso total está em conformidade com as limitações de fábrica e não oferecem nenhuma proteção metálica no caso de uma capotagem. E pra fechar com chave de ouro a sucessão de ilegalidades, não existem cintos de segurança – exigidos por lei – para esta acintosa maracutaia que afronta nossa legislação.

Familia unida… na moto

familia em moto no cambodia foto hanohiki shutterstock
Este flagra foi na Ásia, mas esta situação é comum aqui no Brasil também (Foto: Hanohiki | Shutterstock)

Não é raro encontrar pelo Brasil afora uma família inteira aboletada numa moto, em geral de baixa cilindrada, potência e que anda gemendo pela estrada. Só se vê cenas semelhantes em alguns países asiáticos típicos de Terceiro Mundo.

O pai tem um filho à sua frente, sobre o tanque. Além da mulher atrás dele, outro filho sobre o paralamas traseiro agarrado em sua cintura. Não entendi como, mas já vi dois pirralhos atrás da mãe.

Nenhuma fiscalização

Não há rigorosamente nenhum controle nem fiscalização para eliminar nenhuma destas ilegalidades cometidas impunemente no país. E os acidentes muitas vezes fatais continuam ocorrendo sem que as autoridades responsáveis tomem alguma atitude. Pois já está consagrado que, no Brasil, tem lei que pega e que não pega…

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4 Comentários
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bruno vasconcelos 20 de novembro de 2023

Excelente Artigo!!! FORA QUEBRA-MOLAS QUE MATAM!!! E Uma amiga minha caiu de um Buggie desses de Praia no Nordeste 20 anos atras, quebou o braço, não sabia q ainda estavam fazendo esses passeios perigosos!! Segurança e Leis, SEMPRE em Primeiro Lugar!!!

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Polvo 24 de outubro de 2023

Concordo, Boris. Estes passeios com buggie nas dunas, apesar de divertido e emocionante é perigoso. Eu mesmo já andei “com emoção” e me dei mal, pois estava sentado em cima do motor, aí o buggie deu um grande solavanco e eu pulei junto, na descida eu bati o traseiro tão forte que fiquei o resto dos dias com dor na coluna. Na época eu não era velho, tinhas uns 30 anos…rsrs…mas, analisando pela segurança, é realmente perigoso esse tipo de veículo e, concordo que deveria ter uma fiscalização mais rigorosa no uso desses veículos, pois tem muito cacareco e não dá pra escolher, pois os buggeiros fazem uma fila no local, parecido com táxi, vc tem que aceitar o que estiver em primeiro. Para rodar na praia, em piso plano e baixa velocidade é ótimo, mas esses passeios com emoção acho que é um risco e deveria ser evitado.

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Breno 24 de outubro de 2023

E em BH os policiais militares ou municipais NUNCA fecham o capacete e por consequência a viseira…
Além do péssimo exemplo e risco iminente de lesões em caso de acidente, cobram o uso correto do equipamento nas blitz e fiscalizações…
Também nunca vi nenhum veículo de imprensa cobrar essa pauta…
Também não usam cinto de segurança, até bombeiros já presenciei sem o cinto…
Alguma lei permite essas atitudes?

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Santiago 23 de outubro de 2023

Podemos tambem incluir nessa lista a infame indústria-da-multa, promovida por muitas e muitas prefeituras País afora: Nessa “modalidade” reduz-se o limite de velocidade a niveis ridiculos em vias aonde isso não se justifica, sem qualquer critério técnico, e sob o falso e hipócrita argumento de “salvar vidas”, deturpando a função dos radares e transformando-os em meras máquinas de extorquir dinheiro.

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