Carro no Brasil é mais caro que em outros países?

O que se diz é que são mais caros porque as fábricas ganham 'rios de dinheiro', por aqui. Mas não é bem assim...

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Inflação do carro zero não é um fenômeno apenas no Brasil, mas global (Foto: Marcelo Jabulas | AutoPapo)
Por Boris Feldman
Publicado em 25/05/2024 às 09h03

Não foi só no Brasil: os automóveis ficaram mais caros em todo o mundo. Nos Estados Unidos, 12 modelos custavam abaixo de US$ 20 mil há cinco anos. Em 2023 sobrou apenas um, o Mitsubishi Mirage por US$ 19.205, segundo pesquisa da KBB. Alguns dos motivos que subiram o preço dos carros nos EUA provocaram o mesmo no Brasil, limite às emissões e inflação entre elas. Mas, por incrível que pareça, as fábricas não ganham “rios de dinheiro” no Brasil e às vezes ganham com alguns modelos para compensar o prejuízo de outros. Não sou advogado de nenhuma delas, pelo contrário: tem duas que nem conversam mais comigo…

VEJA TAMBÉM:

1. Tributação

Nossos impostos estão entre os mais elevados do mundo. De cada R$ 100 desembolsados pelo cliente, mais de R$ 40 vão para os cofres públicos. Um pouco menos no caso dos carros “populares”. Nos EUA, o imposto único é de 8%.

2. Poder de compra

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Perda de renda do consumidor impactou no mercado que precisou reajustar preços para equilibrar a balança (Fotomontagem: Ernani Abrahão | AutoPapo)

A grande massa da população, principalmente a que tinha acesso aos automóveis de entrada, perdeu parte de sua capacidade financeira, principalmente no período da pandemia da covid-19.

3. Inflação

Vários países do mundo sofreram deste mesmo mal que nos assola, alguns com taxas semelhantes às nossas nos últimos anos. O que, obviamente, sobre o preço do carro.

4. Emissões

Cada vez que entra em vigor uma nova legislação que torna mais rigoroso o limite de emissões de gases poluentes, as fábricas são forçadas a sofisticar os equipamentos que os controlam. Alguns, como os catalisadores, de custo elevado.

5. Segurança

Outro custo adicional é provocado pela obrigatoriedade de equipamentos de segurança, a maioria eletrônica, como freios ABS, airbags, sistema eletrônico de estabilidade (ESC), etc.

6. Logística

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Escoar a produção no Brasil é muito caro devido a falta de opções de modais como ferrovias ou cabotagem, por aqui tudo é transportado em rodovias (Foto: Shutterstock)

As fábricas enfrentam aqui o “Custo Brasil”: a energia elétrica, a estrutura para lidar com a mais complexa (além de elevada) legislação tributária do mundo, os transportes (rodoviário pela falta do ferroviário) agravados pelas rodovias sem manutenção, os encargos trabalhistas, os portos, para citar alguns.

7. Câmbio

Um considerável percentual dos componentes que abastecem a linha de montagem é importada, principalmente os eletrônicos. E até uma parte do aço. O que significa que as fábricas pagam em dólar, que se valorizou razoavelmente nos últimos cinco anos. Eram necessários R$ 3,87 para se adquirir um dólar em maio de 2019. Hoje, R$ 5,17. Um aumento de 33,6%.

8. Componentes

Além da desvalorização do real, outro fator que encareceu os componentes importados foi seu desabastecimento no exterior devido à pandemia e às guerras. Os microprocessadores (chips) estiveram na berlinda há dois anos. Mas, além deles, a Ucrânia é fornecedora de chicotes elétricos de diversas fábricas. E a Rússia, de revestimentos de bancos.

9. Escala

Nossa produção de automóveis foi recorde em 2013, com 3,7 milhões de unidades produzidas. As fábricas, entusiasmadas, investiam em novas plantas, ampliação das existentes e nossa capacidade de produção superou as quatro milhões de unidades. Mas os mercados domestico e de exportação se encolheram e – mesmo com algum crescimento – as vendas este ano serão inferiores a 2,5 milhões de veículos. Isto significa uma redução de escala e aumento do custo unitário de produção. O que é produzido tem que pagar pelo que não foi… o que se chama de ociosidade.

10. Rentabilidade

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Renault Kardian é o exemplo do novo cenário da indústria que aposta em modelos mais sofisticados para obter maior rentabilidade por unidade vendida (Foto: Marcelo Jabulas | AutoPapo)

É a palavra mágica da indústria automobilística mundial. As fábricas estão se adequando aos novos tempos e em busca de ganhar mais na unidade que na quantidade. Isto significa migrar de carros mais baratos, de entrada, para os mais sofisticados, aumentando o ticket médio da gama. A Renault é um bom exemplo: deixa de produzir no Brasil os modelos da Dacia, sua subsidiária romena que fabrica carros resistentes e baratos (Logan, Sandero, Duster) e vira a chave para os de origem francesa como o SUV Kardian, que “muda tudo”, segundo ela mesma. Não somente no Brasil: é nova filosofia global da marca. O resultado é um sumiço geral de carros baratos, pois quase todas as marcas estão adotando mesma política.

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7 Comentários
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Waslon 2 de junho de 2024

Sinceramente, eu tenho minhas dúvidas sobre os lucros das operações aqui no Brasil. A Ford irá abandonar a mina de ouro? Por outro lado, quantas montadoras já tentaram se instalar no Brasil e não conseguiram?

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Santiago 29 de maio de 2024

Ao longo dos tempos, já foram realizados diversos cálculos comparativos em relação a outros países nessa área.
Nesses cálculos levou-se em conta: a nossa elevada carga tributária; as várias nuances do nosso elevado custo-Brasil; além dos custos em dolar dos componentes importados; sem esquecer-se de contabilizar uma satisfatória margem de lucro. Via de regra chega-se a um valor final realmente acima da média mundial, PORÉM consideravelmente abaixo dos valores de tabela aqui praticados.
Portanto continuamos sim sendo uma jabuticaba, também nesse quesito.

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Anesio Marcelino Roberti 27 de maio de 2024

Boris, façamos as contas.. enquanto a industria automobilistica la fora faz margens de ganhos de 5 a 8%….. se aqui no Brasil conseguirem subsídios governamentais sobre os 30~40% de impostos pagos…… será muito melhor do que o ganho operacional de 5 a 8%… simples assim. pq no PCD se consegue até 22% de descontos e mesmo assim a industria está lucrando!!! tem algo exagerado que é a carga tributaria.

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Anesio Marcelino Roberti 27 de maio de 2024

Boris, parabens por suas materias, vc é um dos poucos jornalistas da industria automotiva que eu leio e presto muita atenção pq nos traz realmente conhecimento ( tenho quase 40 anos como engenheiro a industria automotiva & caminhoes). Com certeza as margens de lucro no Brasil são maiores que no exterior pq existe um risco maior no Brasil ( não estou aqui defendendo a Industria automotiva não). Veja agora toda industria anunciando investimentos bilionarios na produção local de novos modelos… pq nunca fizeram isso antes e precisou a industria chinesa invadir nosso mercado para se mexerem….. mas…. sempre tem um porem… todos foram a Brasilia para anunciar seus investimentos… PQ??? é obvio que querem – e terão- beneficios tributarios que ja deve estar prometido pelo governo!!! Como a carga tributaria é exageradamente alta.. qualquer incentivo chega a ser bem maior que o granho operacional…. produção, produtividade…. então o melhor negocio do Brasil é anunciar investimentos e ir a Brasilia pedir incentivos tributarios…… ganha-se muito mais…

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Paulo Gomes 29 de maio de 2024

Tudo bem, a indústria até pode ter uma margem de lucro maior por aqui, no entanto, para o consumidor, sempre pagará mais caro devido a já sabida carga tributária. Peguemos essa conta simples do Boris, onde o americano paga de imposto 8%, enquanto nós pagamos 40 e pouco. fazendo um cálculo simples, o norte-americano paga cerca de 35% (100*0,60> 60*1,08=64,8>100-64,8=35,20) a menos que o brasileiro. E veja, eles tem ganhos bem superiores ao nosso, e ainda, não levando em considerção que as taxas de financiamento são bem menores, e, ainda, que os seus produtos são mais completos.

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Waslon 2 de junho de 2024

Tenho uma observação para engrandecer a discussão. Fazer anúncio de investimento é uma coisa, investir é outra totalmente diferente.

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Tobias 26 de maio de 2024

Só faltou dizer que margem de lucro aqui é bem mais alta em percentual e que está grana vai para matriz… não?

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