Montadora impede acesso do dono aos dados técnicos de seu próprio carro 

Right to Repair: até o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, criticou o monopólio de informações das concessionárias

mecanico de bracos cruzados
É justo que os fabricantes não repassem informações? (Foto: Shutterstock)
Por Boris Feldman
Publicado em 07/05/2022 às 07h30

No dia em que pifou a máquina agrícola (da marca John Deere, nova, na garantia) de um fazendeiro norte-americano, ele pediu assistência ao concessionário, mas foi informado que os técnicos só chegariam três dias depois.

“Não posso ter todo este prejuízo com a máquina parada no campo”, ele alegou e explicou que seu mecânico tinha condições de repará-la. A revenda autorizada respondeu que só seus técnicos com ferramentas especializadas poderiam consertá-la, ou ele perderia a garantia.

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Oficina não tem informação

Este é um dos milhões de casos que acontecem no mundo inteiro devido ao impedimento – pela fábrica – do acesso ao produto por seu próprio dono, ou oficina de sua confiança.

Além de barrar qualquer revisão fora da concessionária durante o período de garantia, o que ainda seria justificável, tem pior: com a sofisticação eletrônica cada vez mais presente nos veículos, a fábrica tenta impedir o acesso de oficinas independentes aos dados básicos para reparar, regular ou ajustar os componentes.

Mesmo tendo um computador, os mecânicos não têm os parâmetros necessários para a manutenção, pois as fábricas não os disponibilizam oficialmente, prejudicando assim as oficinas independentes.

Primeiro Mundo: Right to Repair

Esta briga deu origem a um movimento chamado “Right to Repair” (Direito de Reparar) na Europa e nos EUA, onde o deputado democrata Bobby Rush apresentou projeto de lei para assegurar a donos de veículos e oficinas independentes o mesmo acesso às ferramentas de reparo e manutenção que as concessionárias.

Até o presidente Joe Biden se envolveu no assunto e criticou – no início deste ano – que “o dono do produto, de um smartphone a um trator, não tenha a liberdade de escolher como e onde reparar o item adquirido”.

A idéia é obrigar as fábricas a disponibilizarem – mesmo que a um custo razoável  – estas informações ao mercado.

O movimento foi assumido no Brasil pelo Sindirepa, sindicato dos reparadores de veículos, que já enviou cartas para as montadoras questionado o assunto. Se elas negarem sua pretensão, vai levar o tema a parlamentares para se estabelecer uma legislação semelhante à do Primeiro Mundo.

Sindirepa destaca a falta de capilaridade

Antonio Fiola, presidente do Sindirepa-SP, ressalta que existem cerca de 90 mil oficinas e apenas 5.000 concessionárias no país.

“A própria falta de capilaridade da assistência técnica das fábricas revela a impossibilidade – diz Fiola – de as oficinas autorizadas prestarem manutenção aos veículos. Quantas cidades no Brasil não contam com nenhuma concessionária?

O dono do carro deveria ter o direito à liberdade de escolha. De decidir onde e como seu veículo receberá manutenção. E de receber – ele e a oficina independente – as informações necessárias para o reparo do automóvel que se trata de um bem durável.

A própria fábrica deveria se preocupar com este problema, que causa a desvalorização de seu produto no mercado por falta de manutenção, o que prejudica a própria marca”.

Pirataria

Além disso, mesmo com a tentativa da fábrica de impedir, sabe-se que estas informações acabam chegando – às vezes distorcidas e desatualizadas – às oficinas independentes por  “pirataria”.

Pesquisei o setor, para entender os mecanismo da obtenção irregular destes dados: um deles é por meio do gerente de peças de uma concessionária, que tem interesse numa oficina independente como cliente. Pede então ao responsável da sua oficina uma cópia (ilegal) do arquivo com os dados fornecidos pela fábrica e a repassa. Garante assim a venda de peças para o mecânico independente.

Mas há um consenso de que as fábricas devem ceder oficialmente estas informações ao dono do carro, nem que sejam obrigadas por uma legislação específica.

E como funciona a garantia para carros usados? Explico neste vídeo:

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11 Comentários
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PAULO RENATO AZEVEDO 18 de maio de 2022

COBRAM UMA EXORBITÂNCIA PELA TAIS REVISÕES, OS COMPONENTES TROCADOS CUSTAM QUASE O TRIPLO DO PREÇO DAS MARCAS CONCEITUADAS VENDIDAS NO COMÉRCIO ! ÊTA BRASILSINHO DANADO ! FORTE ABRAÇO, BORIS.

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Marvim 14 de maio de 2022

O negocio deles e manter o monopólio da manutenção, eu acho que nem deveria haver manutenção mesmo de garantia em concessionaria, poderia haver oficinas autorizadas pelos fabricantes, como e feito pelas seguradoras, e o mesmo ocorre com peças, que dizem ate que e original, porem nem e fabricada pela montadora, pagamos pela marca, e não pelo valor real da peça, e ai vai, a exploração mundo a fora.

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Francisco Neto 13 de maio de 2022

Tenho uma AirCross 2018 desde 0Km (e gosto do carro). Rodo pouco, e na segunda revisão OBRIGATÓRIA, tive que pagar mais do dobro que o comprometido pela fábrica CITROËN na hora da compra do carro (as 3 primeiras revisões por R$365,00 cada uma) para substituir o fluido de freio (paguei como extra um serviço que constava no Manual como necessário).
Já na terceira (e espero que última) revisão optei pelo “pacote básico” com troca de óleo e filtro de óleo e acabei pagando quase o dobro, “porque passou muito tempo” e o compromisso foi desfeito unilateralmente. Além disso, completaram de “graça” o reservatório do líquido de arrefecimento com água de torneira, e não com água desmineralizada, como preconiza o fabricante do carro. Ao reclamar, a atendente me pediu desculpas e ofereceu para trocar de graça todo o líquido de arrefecimento, desde que eu comprasse o produto naquela mesma hora. FUGI de LÁ. Preferi sair correndo e mandar fazer a substituição no meu mecânico de CONFIANÇA.
A marca é Citroën e a Concessionária que ficou com meu dinheiro foi a DINISA NITERÓI. Se puderem, fujam de lá.

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Edison 12 de maio de 2022

No meu modo de pensar acredito q qd vc compra um veículo o carro é seu, mas qd obrigam a fazer manutenção ou retirar algum defeito na concessionária deixamos de ser democráticos e passamos as ser burrocráticos ou melhor dizendo: escravos das montadoras.

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Luís Gomes 12 de maio de 2022

Lembro do meu tempo de estudante de engenharia onde pedi a VW Br o gráfico de Torque x Potência do Gol 1.6. Me responderam que era informação confidencial e não poderia ser repassada. Encaminhei então, um e-mail para VW AG na Alemanha. Para minha surpresa, na semana seguinte recebia via correio, todos os dados do motor AP600, com textos, em alemão, mais as homologações e parâmetros. Bem como um desejo de desfrutar das informações em meu futuro profissional.

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Paulinho Gomes 12 de maio de 2022

Ja troquei serviços autorizados por oficinas do zé faísca e do pica fio e me dei muito mal.
Não dianta esperniar, aqui no Brasil somos reféns das montadoras de carroças, empresas de telefonia, provedores de internet e prestadoras de serviços de infofmática.

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Paulinho Gomes 12 de maio de 2022

…*espernear..

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arai 12 de maio de 2022

Palmas para Dr. IE!!!

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Ricardo 12 de maio de 2022

Eu trabalhei em uma concessionária Caterpillar e era constantemente assediado por oficinas e retíficas para passar informações de calibrações e outras informações, as quais o fabricante proíbe e esconde à sete chaves alegando que somente a autorizada tem capacidade técnica para manter o equipamento em perfeitas condições.

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Jo 8 de maio de 2022

Tenho asco de concessionária. Quando comprei meu carro fiz somente as 2 primeiras revisões lá e preferi “perder” a garantia, levando em oficinas mais competentes para manutenção do dia a dia. Esse caso de implementos agrícolas é absurdo e conheço na prática.

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Rodolfo 7 de maio de 2022

Comprei um carro 0-km em 2019, fabricado no Brasil, não vou falar o modelo para não criar rótulo, o carro veio com a porta do porta-luvas riscada de fábrica, foram mais de 40 dias para trocarem pra mim. Foi um Chá de cadeira pra trocar a porta do porta-luvas, umas 3 horas pra trocar a peça. No Youtube se vê que lava no máximo 5 minutos.
Então se uma coisa simples dessa foi 3 horas imagine um problema grave o tempo de espera… fora o valor da conta que será seguramente maior do que em uma oficina independente.

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