Quando o ‘frio de rachar’ impede a visão do motorista, o que fazer?

"Em poucos segundos, o para brisa dianteiro do carro transformou-se em uma placa de gelo, que não permitia visão de sequer um dedo adiante."

para brisa congelado
Por Douglas Mendonça
Publicado em 30/07/2018 às 18h16

Esse fato, incomum para nós brasileiros, ocorreu em meados dos anos 90 e deu o que falar. Eu estava em uma viagem de trabalho, lá pelas bandas do Grand Canyon, nos Estados Unidos. Naquela época, a Renault estava apresentando, de maneira inusitada, a nova versão de sua mundialmente famosa Renault Espace, que foi uma das primeiras vans mundiais e que difundia esse conceito de carro familiar por todo o mundo.

E a marca francesa fez esse lançamento justamente no mercado norte-americano, o maior desse segmento no mundo. Um modelo europeu sendo apresentado em sua nova versão para o mundo nos Estados Unidos. Parecia até mesmo uma provocação à indústria automobilística norte-americana.

Viajamos à terra do “Tio Sam” em um grupo pequeno de jornalistas: éramos quatro profissionais das principais revistas especializadas e a assessora de imprensa da Renault. E o evento de lançamento para os profissionais da América latina, assim como do restante do mundo, seria feito na região do Grand Canyon, onde, inclusive, sabíamos que teríamos um excelente pano de fundo para realizarmos as tão sonhadas e perfeitas fotos para os nossos leitores. Depois do primeiro contato com a nova van da Renault e as explicações de como era fabricado o novo produto, com detalhes construtivos e da mecânica apurada do novo familiar, tivemos um teste drive para sentir ao vivo e a cores a dinâmica do novo carro. Show!

Cenário espetacular

Naquela noite, ficamos hospedados em um bom e confortável hotel da região e a Renault disponibilizou para os profissionais brasileiros dois carros que ficaram sob a nossa guarda. Combinamos todos que no dia seguinte, antes mesmo do dia nascer, nos dirigiríamos a um ponto conhecido que era uma espécie de um mirante onde, ao fundo, descortinava-se a imagem linda de um ponto do Grand Canyon – quando o dia amanhecia, nos explicaram no hotel, a luz solar iluminava aquele desfiladeiro lindo ao fundo.

Estava fechado, nossas fotos maravilhosas seriam feitas lá! Nos preocupamos em dar uma boa limpada superficial nos carros para deixá-los prontinhos para a nossa partida às 5 horas da manhã, pois havíamos sido informados que o sol nasceria por volta das 6 horas. Como estávamos a cerca de meia hora do tal mirante, pensamos em meia hora de folga para posicionar os astros para a foto de nossas edições.

Como combinado, no dia seguinte, às 4 da manhã todos estavam de pé para que pudéssemos sair pontualmente às 5h, como estava combinado. Só não sabíamos de um detalhe: um pouco antes do dia amanhecer, a temperatura ambiente girava ao redor de 0°C e, depois das 10 ou 11 da manhã, quando o sol estaria alto, tudo voltaria ao normal, na casa dos 18°C ou 20°C.

Aparentemente, isso era apenas um pequeno detalhe. Mas, descobri depois, que o detalhe não era tão pequeno assim quanto eu fazia crer. Depois do café da manhã, partimos às 5, a assessora de imprensa da Renault e os dois profissionais de jornalismo iam no carro da frente e eu os acompanhava atrás com a minha amiga jornalista Priscila Cortezze, na época fazendo seu trabalho para os leitores da Revista Carro, enquanto eu, Douglas Mendonça, realizava o trabalho para os meus leitores da revista Motor Show.

A estrada era de pista única e mão dupla, repleta de aclives, declives e curvas, mas bem ao estilo norte-americano, bem-sinalizada e pintada, o que auxiliava o ato de dirigir, em que pese a leve névoa decorrente do frio. Outro ponto que incomodava nessa estrada era o excesso de árvores ao lado da pista ao longo de todo o trajeto. Um caminho que não permitia erros e requeria muita atenção de quem dirigia. Continuei trafegando nessa estrada e andávamos sempre em velocidades que giravam ao redor dos 60 ou 70 km/h. Exatamente o que indicavam as placas de sinalizações.

Péssima ideia…

Nesse instante, tive o meu momento infeliz: achei que acionando o lavador do vidro dianteiro, poderia ter melhorada a minha visibilidade no enorme para-brisa da Renault Espace. Só esqueci de um pequeno, mas enorme detalhe: a temperatura exterior estava um pouco abaixo de 0°C e todos sabemos o que acontece nesse momento, a água congela imediatamente.

Foi algo instantâneo, com o lavador esguichando a água, essa água imediatamente congelando e o limpador de para-brisa ainda espalhava a água ainda liquida que ia se congelando. Em poucos segundos, o para brisa dianteiro do carro transformou-se em uma placa de gelo, que não permitia visão de sequer um dedo adiante. Uma catástrofe!

Instantaneamente entrei em pânico, pois perdi a visão do caminho que deveria trilhar. E a estrada, onde estava? E as àrvores que eu tanto respeitava, onde estariam naquele momento? Instintivamente tirei o pé do acelerador e em um movimento contínuo acionei a abertura elétrica do meu vidro e como um velho e bom maquinista de trem, coloquei a cabeça para fora para saber onde estava e para onde deveria ir.

Nem é preciso dizer que o vento frio parecia cortar a pele do meu rosto e que minha amiga Priscila entrou em um verdadeiro clima de horror, mas tudo sob controle. Pisquei insistentemente os faróis do meu carro para chamar a atenção dos colegas que iam a frente, que entenderam o pisca para a direita indicando que eu iria parar e fizeram o mesmo. Consegui parar o carro com segurança. E entre mortos e feridos, todos escaparam.

Expliquei o que havia acontecido e percebi que esse erro poderia ter acontecido com qualquer um de nós brasileiros. Afinal de contas, não estamos acostumados a situações climáticas desse tipo e, por isso, somos pegos de surpresa nessas situações inusitadas. Demos um jeito de raspar o gelo grudado no para brisa e, em menos de 10 minutos estávamos partindo para as nossas tão esperadas fotos. Minha amiga Priscila Cortezze, atualmente Diretora de Comunicação da Volkswagen, tomou um grande susto, pelo qual hoje, cerca de 20 anos depois, peço desculpas.

Todos realizamos nossas matérias e fizemos aquelas fotos ótimas, que os nossos leitores desfrutaram e curtiram. Erro que, depois da lição, jamais cometerei novamente. Que sirva para os desatentos.

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2 Comentários
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David 30 de setembro de 2018

Muita história pra chegar no assunto proposto pelo título.

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Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva 31 de julho de 2018

O trabalho de aerodinâmica dos automóveis melhorou muito esse problema. Quando se usavam para-brisas planos, não era preciso ligar lavador algum. o Acúmulo de umidade já dava conta de fazer congelar tudo. Quem viveu em Santa Catarina nos anos 1960, quando o frio comia solto por lá, enfrentou esse problemas com Fuscas sem aquecimento. Meu tio, que era engenheiro da Klabin e antes vivera nos Estados Unidos, passava água salgada no vidro e o secava bem para continuar a viagem. O normal seria ligar o ar quente no máximo e apontá-lo para o vidro antes de sair. Foi o que fizemos no inverno de 2004 nos Emirados Árabes Unidos, pois a temperatura ao nascer do sol era de -5°C.

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